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Desbravar


Posso dizer que já conheci o mundo. Não foi fácil. Quando comecei a viagem, os destinos em que fui levada não eram escolhas minhas. Passei por desafios que só um ser como eu sabe. Enfrentar obstáculos que surgem, é o principal da vida.

Primeiramente, eu acompanhava o meu grupo. Conheci locais que passaram a ser comuns em minha vida. Praças, hotéis, prédios, condomínios, parques. Porém, ao ficar solta, passei a ter dificuldades. Senti-me fraca. Fui carregada para outros países. Vi cenas de felicidade e tristeza, sinceridade e mentira, respeito e arrogância. Situações que me motivaram e às vezes enfraqueceram o meu “eu” no caminho em que estava seguindo.

Conflitos e atos de solidariedade foi o que mais vi. O primeiro desbravar sozinha foi em meu próprio país. Já estava só, e não tinha como voltar. Deveria seguir o percurso que havia sido escrito pelo destino. Pela primeira vez, observei um homem maltratando o outro. Não sei porquê, mas talvez, por eu estar com o meu grupo, nunca me preocupei com o mundo.

Esse homem criticava o outro. Talvez pela sua identidade. Tinham o mesmo tamanho, as mesmas características, porém, eram diferentes em apenas uma coisa: no sentimento. Apesar de estar sendo ameaçado, o outro não mudava a postura. Ele aparentou tentar conversar, parecia querer criar um laço, tentar compreender o motivo de tanta discórdia no coração daquela pessoa. Mas não consegui ver o final da história, pois como na primeira vez, fui levada para outro lugar.

Chegara em um parque. Que paisagem bela. As pessoas daqui, estavam brincando, conversando, lendo, se divertindo. Isso me inspirou e trouxe um pouco de felicidade em meu coração, que estava um pouco machucado devido ao afastamento de meu grupo, no qual não tive escolha em abandoná-los.

Novamente, após esta tranquilidade, o vento me enviou para um outro local. Entretanto, já era um ambiente muito diferente. Eu não entendia o que as pessoas falavam. Palavras estranhas, as quais não conseguia identificá-las. Estava muito frio e via no rosto de cada uma o símbolo da tristeza.

Aquela cidade estava dividida. Era nítido o sentimento de infelicidade nas populações divididas, porém, passado um minuto, com a queda de uma barreira, as pessoas choravam de felicidade, cumprimentavam o outro lado. Havia sido eliminado o muro que bloqueava a convivência das pessoas, já não existia mais dois lados. Foi algo magnífico em meu coração... mas, novamente, lá estava eu viajando.

Diferente do outro clima, esse estava quente. Era um deserto. As pessoas daqui demonstravam estar com fome, e era notável a extrema pobreza. Vi crianças morrendo de fome, sem esperança, famílias desistiam da vida. Aquelas cenas foram me atormentando, queria ir embora. Por que nesse momento eu não posso ir, me perguntava. Sempre quando quis continuar vendo as cenas anteriores, você me deslocava sem a minha decisão.

Passaram-se algumas horas e nada de sair daquele horrível ambiente. De repente, chegou um enorme veículo trazendo água, alimentos, propagando atos de solidariedade e promovendo a felicidade para aquelas pessoas. Que momento, fiquei muito feliz, e agora pude entender o motivo de ele não ter me levado. Após alguns minutos, eu já esperava, e fui carregado novamente.

Essa foi a viagem mais longa. Demorou dias e dias para que eu pudesse finalmente parar e descansar. Aqui estava tudo calmo, não tinha nada para atrapalhar, as pessoas viviam tranquilamente, sem nenhum problema. Por isso, não despertou nenhum sentimento de indecisão, fiquei calma junto com elas e adormeci, algo que eu não fazia há muito tempo...

Contudo, uma grande onda adentrou sobre a cidade alagando todo o ambiente. Várias famílias perderam suas casas, filhos, mães, pais, avós. Era uma cena de destruição em todos os cantos, parecia não ter o que ser feito. Em cima de uma árvore, fiquei assustado. Como a natureza pode ser tão má a ponto de destruir quase toda uma região?

Entretanto, sem serem abalados, todos foram em busca de um único objetivo. Reestruturar toda aquela situação e construir novamente a cidade. Alguns meses se passaram, e tudo estava pronto. As pessoas se uniram e com o sentimento de decisão restauraram todo o ambiente.

Após este dia, fui levado para o pico de uma montanha. Fiquei parada lá por quase três anos. Creio que seja esse tempo. Nos primeiros dias foram difíceis. Não conseguia me acostumar com aquele local, tive diversos pensamentos, os dias pareciam não passar, e o vento que me levara em todas essas viagens sumiu de repente.

Percebi que para me confortar, eu tinha de analisar a mim mesma, e, assim, refleti, todos os momentos que vivera nessas longas trajetórias. Logo que terminei a reflexão, uma luz atingiu o meu pequeno corpo e voltei a ser carregada.

Fui levada para um conflito, parecia um cenário de guerra. Era horrível, pessoas assustadas, corpos caídos, policiais e guerrilheiros por todos os cantos. E nada daquilo parecia acabar.

No dia seguinte, em frente a um monumento, várias pessoas choravam, colocavam flores, velas, quadros e mensagens, todas sem esperança e temerosas, voltavam para suas casas. Aquilo foi me amargurando, e lembrando-me de quando eu estava na montanha, eu precisava agir. Levantando-me só, fui para o meio daquelas pessoas. Todas pararam para me olhar.

“Paix”, foi o que elas disseram. Lembro-me perfeitamente. Após isso, todas mudaram seus corações, e felizes, começaram uma a incentivar a outra. Naquele momento percebi o meu desbravar. Eu precisava conhecer o mundo, entender as dificuldades de cada pessoa, observar as minhas fraquezas e fazer a minha revolução interior.

Consegui! Venci! Uma pessoa pegou-me e levou para sua casa. Por meio dela, hoje sou uma pena escritora, que veio aqui contar toda a história de meu levantar...

Como dizia Walt Whitman: “Daqui em diante, não questiono a boa sorte, a boa sorte sou eu. De agora em diante, não vou mais lamentar, não vou mais adiar (...). Forte e contente, viajo pela estrada aberta.”.


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